Ainor Loterio - Cursos, Palestras e Treinamentos

O poderes do SIM e do NÃO na sucessão agrícola.

*Ainor Lotério
Durante mais de trinta anos atuando como extensionista rural e de juventude, envolvido em pastorais da juventude e agora como palestrante, muitas respostas obtive de pais e mães de famílias agricultoras sobre a permanência ou não de seus filhos na roça.
Abaixo, respostas a duas perguntas que fiz constantemente aos agricultores nestas três décadas de extensão rural. Uma provoca o SIM e outra o NÃO.
1.
Poderes do SIM: por que recomenda aos filhos permanecerem na agricultura?
-É um lugar bom para viver e ganhar dinheiro, se for bem administrado.
– Quando tem boa formação devemos incentivar a permanência da força da juventude na propriedade.
-Por que alguém tem que produzir alimentos e manter a propriedade.
-Não deixar a propriedade abandonada, quero ter um sucessor.
-Porque existe mais confiança e garantia no recebimento, especialmente quando somos cooperativados.
-A agricultura é viável, a propriedade está organizada e tem rentabilidade.
-Porque acredito na agricultura familiar.
-A vida na agricultura de um modo geral é mais saudável do que na cidade.
-Sempre vai ter gente para comer e a agricultura é boa para quem sabe fazer.
-Por gostar da atividade e querer que haja a sucessão.
-Pessoas que deixaram o campo e foram morar na cidade e estão insatisfeitas.
-Também porque alguém vai ter que cuidar dos pais e tocar a propriedade.
-Para continuar o trabalho na propriedade estruturada e pela continuidade do mercado de trabalho.
-Acha que é melhor do que viver na cidade. Para superar os problemas ainda é melhor viver no campo.
-Podem ser donos do próprio negócio e serem independentes.
-Para ter continuidade e para haver uma evolução da propriedade que foi conduzida com sacrifício.
-Por que é um lugar para viver com segurança e qualidade de vida.
-Tem uma propriedade rentável e organizada, com salário melhor do que na cidade.

2. Poderes do NÃO: por que não incentiva os filhos a permanecerem na agricultura?
– A escolha fica para o futuro.
-Cada um tem o direito de escolher sua profissão.
-Dando incentivo para que ele escolha uma profissão que ele se de bem.
-Acho que os filhos foram mal educados e são muito imediatistas, querem resultados logo!
-Na época em que os filhos estavam em casa o que se falava na agricultura era ruim!
-Os filhos estão queimados com a imagem da agricultura.
-O baixo valor dos produtos agrícolas não ajuda a incentivar.
–A prioridade dos filhos é estudar e não a roça.
-Falta de incentivos por parte dos governantes.
-Muito sofrido, bastante trabalho e, às vezes, sem lucro.

ENTENDENDO AS QUESTÕES EM TÓPICOS
-Se a maioria recomenda aos filhos permanecerem na agricultura, fazendo a sucessão, por que eles vão embora? Há alguma razão no seio familiar que precisa ser desvendada.
-Alguns fatores podemos apontar para entendermos o poder do NÃO sobre o SIM com relação à sucessão.
-Como podemos ver, o SIM tem bem mais respostas positivas do que o NÃO, mas foi o não que fez a juventude debandar do campo, num processo histórico de êxodo rural juvenil e inchaço das cidades. 
-Estou encima da, mas a terra não está dentro de mim! Este é o sentimento de quem cultiva a terra sem amor.
-O pai que não recomenda ao seu filho a sua atividade com convicção certamente não está satisfeito com ela.
-A atividade agrícola é mais do que um negócio, mas também uma filosofia de vida, a qual pode ser repassada aos filhos com este sentido: a terra não encerra a vida, mas possibilita sempre o seu recomeço. É dela que a semente brota, a raiz se aprofunda e os frutos aparecem. Quero ser enterrado na terra, voltar à terra.  
-“Eu sou a videira, vós sois os ramos e meu Pai é o agricultor”. Esta frase do Mestre Jesus caracteriza bem o valor e o significado econômico, social, familiar e místico da agricultura. Trata-se da primeira profissão do mundo, dita e abençoada por Deus. Mesmo assim, encontramos gente dizendo que o agricultor é muito sofrido, que a agricultura é uma atividade muito dura, que os filhos não querem mais enfrentar a dura lida dos pais. Sofrer mesmo sofre quem saiu da lavoura e se deu mal (vejo muito isto aqui no litoral).

UMA HISTÓRIA REAL E CONSIDERAÇÕES PARA FINALIZAR
Certo dia, em uma palestra sobre sucessão na agricultura familiar, perguntei a um pai se ele incentivava seus filhos a serem agricultores?
Ele me respondeu que não.
Perguntei-lhe por quê?
Assim ele me respondeu: Não quero que eles se arrependam mais tarde, pois a agricultura é muito sofrida.
Ora, toda profissão que escolhermos um dia poderá nos trazer arrependimentos e desajustes profissionais, não é só a agricultura.
Quando não temos a coragem de recomendar aos nossos filhos a atividade agrícola da qual tiramos nosso sustento, a qual nos possibilitou criá-los, prover seus estudos, aquisição de bens, boa alimentação, saúde e lazer, etc, que tipo de agricultores somos? Certamente o tipo que faz agricultura sem a menor convicção, mas por não saber fazer outra coisa.
Agricultor de verdade tem orgulho de ser o que é. Faz o que faz por prazer, conhecimento e certeza de que é uma grande atividade, geradora de bons lucros, apesar de passar por dificuldades e crises.
Agricultor que diversifica as suas atividades também diversifica o diálogo com os filhos e torna a sua atividade sustentável.
Não vivemos mais a época do “não ri seu moço daquele colono” (saudoso Teixeirinha), mas o tempo de promover a permanência saudável dos jovens no campo, tornando-os agricultores inovadores, sofisticados, respeitadores do meio ambiente, cooperativados e realizados. Quem anda pelos grandes centros urbanos percebe que as propriedades agrícolas organizadas estão ficando chique e as periferias das cidades estão ficando bregas, bregas de problemas sociais. Não quero impor nenhum tipo de preconceito para as cidades, mas é bom não nos esquecermos que se o campo não planta, a cidade não janta.
Para que a sucessão no campo (proposta fundamental da Cooperalfa) seja sustentável, há a necessidade de constante empenho de todos os pais, mães, avós, irmãos, tios, tias, vizinhos, técnicos, lideranças (comunitárias, cooperativistas, políticas, esportivas, eclesiásticas, etc.), meios de comunicação, enfim, todos as forças vivas da sociedade podem fazer alguma coisa. Felicidades a todos, mas especialmente aos jovens.

*Engenheiro Agrônomo, filho de agricultor familiar e cooperativista, palestrante-www.ainor.com.br  – (47)3365-0264; contato@ainor.com.br